Entrevista sobre Tireoplastias com o Prof. Domingos Tsuji
1 – ABLV Entrevista: O que são as tireoplastias e quais são os tipos?
Dr. Domingos Tsuji –Tireoplastias, Cirurgias do Arcabouço Laríngeo ou Laringoplastias são um grupo de cirurgias realizadas no esqueleto laríngeo, através de acesso transcutâneo, cujo intuito é melhorar a voz em determinadas situações de distúrbios vocais.
2 – ABLV Entrevista: Em nosso meio, qual é a porcentagem de procedimentos que é realizada atualmente em cada tipo?
Dr. Domingos Tsuji – Em um levantamento recente feito com meus pacientes particulares, as tireoplastias correspondem a 10% das fonocirurgias.
3 – ABLV Entrevista: Na tireoplastia tipo I, quais são os melhores materiais de implante? Por quê?
Dr. Domingos Tsuji – Os materiais mais utilizados são o silicone sólido (silastic), o Gore-Tex, hidróxido de apatita, entre outros. Eu, particularmente, gosto mais do silastic, por uma questão de hábito. Outros preferem o Gore-Tex, por considerarem mais “moldáveis” no momento do ajuste vocal. Porém, acredito que mais importante do que o tipo de material utilizado, são os quesitos para o sucesso da cirurgia, ou seja, a posição da janela, suas dimensões e o grau de medialização obtida com a colocação do implante. E creio que esses fatores dependem muito da experiência e habilidade do cirurgião.
4- ABLV Entrevista: Qual o papel da reinervação associada à tireoplastia tipo I nos casos de paralisia? Em nosso meio, a reinervação é uma opção? Em que casos ela está indicada?
Dr. Domingos Tsuji – Na literatura, a maioria dos cirurgiões não associa a reinervação com a tireoplastia tipo I. Os que o fazem acreditam que a reinervação, ainda que não devolva a contratilidade muscular, ajude a manter o tônus muscular e assim evitaria a evolução do processo de atrofia da prega paralisada. Esta atrofia poderia continuar a ocorrer após a tireoplastia e, por conseguinte, causar uma nova deterioração vocal após a cirurgia. Seguindo neste raciocínio, a reinervação estaria indicada, a rigor, nos casos onde há sabidamente uma desnervação completa do músculo tireoaritenóideo. Ou seja, naqueles casos onde não há nenhum tipo de reinervação ou fluxo neuronal.
5- ABLV Entrevista: Quais são as sugestões na realização da tireoplastia tipo I em casos de desnivelamento de pregas vocais?
Dr. Domingos Tsuji – É uma questão difícil de responder. Caso o desnivelamento seja decorrente de uma posição muito lateralizada da prega paralisada, a associação da rotação de aritenóide pode ser muito eficiente. Por outro lado, se o desnivelamento ocorrer com a prega vocal em posição mediana ou paramediana, a correção é muito difícil e, até onde eu saiba, não há nenhuma técnica cirúrgica realmente eficaz e precisa para essa finalidade. Uma possibilidade técnica nessas situações é tentar medializar a prega vocal paralisada com um implante um pouco maior do que o usual, no sentido crânio-caudal, com o intuito de engrossar a espessura da prega e assim conseguir obter, pelo menos, um pequeno contato dessa prega vocal desnivelada com a contra-lateral sadia. Teoricamente isso possibilitaria uma melhor fase fechada do ciclo vibratório e melhor qualidade vocal. Do ponto de vista prático, no entanto, é difícil porque nem sempre conseguimos restaurar as condições ideais.
6 – ABLV Entrevista: No caso da tireoplastia tipo I em paciente com paralisia de prega vocal, o que se pode esperar do resultado a longo prazo?
Dr. Domingos Tsuji – Baseado única e exclusivamente na minha experiência, a impressão que tenho é que se a voz não apresentar sinais de deterioração até 6 a 8 meses de pós-operatório, ela persistirá estável a longo prazo.
7- ABLV Entrevista: Na tireoplastia tipo I, o senhor usa como parâmetro a qualidade vocal ou a visibilização da laringe para decidir a posição do molde? Por quê?
Dr. Domingos Tsuji – Na verdade, uso a qualidade vocal como parâmetro para o ajuste das dimensões de profundidade do implante, mas quando a posição da janela está em questão, a visibilização passa a ser fundamental. Admitindo que a posição da janela esteja adequada, a profundidade do implante, que deve ser ajustada às vezes em uma ordem de grandeza de frações de milímetros, é mais bem determinada pela qualidade da voz que escutamos. Eu diria que os nossos ouvidos são mais sensíveis do que os nossos olhos para perceber o impacto dessas pequenas dimensões sobre a posição da prega vocal.
8 – ABLV Entrevista: Quais são as principais complicações das tireoplastias e como podem ser evitadas?
Dr. Domingos Tsuji – A complicação mais freqüentemente observada na tireoplastia tipo I é a extrusão do implante para a luz da laringe. Ela pode ser evitada mantendo-se a cartilagem da janela, sem removê-la. Caso a sua remoção seja obrigatória para conseguir um melhor ajuste vocal, deve-se descolar o pericôndrio interno, ao redor da janela, com o máximo de cuidado, sem penetrar na luz laríngea. Sendo tomados estes cuidados, dificilmente haverá extrusão do material implantado. A fixação do implante ao redor da janela com suturas de nylon também podem ajudar a mantê-lo no lugar, pelo menos nas primeiras semanas de pós-operatório. Embora não sejam exatamente complicações, alguns resultados funcionais insatisfatórios podem ocorrer. E estes estão relacionados principalmente com um posicionamento incorreto da janela (que na maioria das vezes é feita mais cranialmente do que o ideal) e o ajuste inadequado da profundidade do implante. A primeira pode ser evitada desenhando-se a linha correspondente à borda livre da prega vocal, de forma bem paralela à borda inferior da lâmina da cartilagem tireóidea, e seguindo-se as orientações já minuciosamente descritas no livro e publicações do professor Isshiki. A segunda, ou seja, a profundidade do implante, depende principalmente de um meticuloso ajuste vocal intra-operatório. Em alguns casos a nasofibroscopia realizada concomitantemente pode ser bastante útil.
9 – ABLV Entrevista: Nos pacientes transexuais, qual é o papel atual da tireoplastia tipo IV? Ela é superior a glotoplastia? Quando deve ser associada?
Dr. Domingos Tsuji – Minha experi&ec
irc;ncia com a tireoplastia tipo IV é pequena e os resultados têm sido moderadamente satisfatórios. Não tenho experiência com a glotoplastia, mas a técnica é teoricamente interessante. Considero, porém, que esta cirurgia pode estar sujeita a um maior risco de complicações do que a tireoplastia tipo IV, por atuar diretamente na mucosa cordal.
10 – ABLV entrevista: O que se pode esperar do resultado da tireoplastia tipo IV a longo prazo?
Dr. Domingos Tsuji – Dentro da nossa pequena experiência, cerca de 50% mantêm o bom resultado obtido inicialmente. Outros 50% referem perda da voz aguda obtida inicialmente, ou seja, parece haver uma reversão espontânea da cirurgia.
11 – ABLV entrevista: Poderia deixar uma mensagem final para os laringologistas com interesse nessa modalidade cirúrgica?
Dr. Domingos Tsuji – Essas cirurgias são extremamente gratificantes, pois os resultados são muito imediatos e satisfatórios na maioria das vezes. Por se tratar de uma abordagem externa sobre o esqueleto laríngeo, são quase todas reversíveis, caso o resultado seja negativo. Deste ponto de vista, também são cirurgias bastante seguras. Porém, é importante salientar que o conhecimento das referências anatômicas é fundamental e, por isso, o ensaio prévio das diversas cirurgias em laringes excisadas e sob supervisão de profissionais mais experientes são absolutamente necessárias. Dentre as cirurgias, a rotação de aritenóide é bastante complexa e realmente requer bastante treino em peças anatômicas. Finalmente, agradeço à ABLV por me prestigiar com esta oportunidade. Muito obrigado!